o0o A Companhia de Artilharia 3514 foi formada/mobilizada no Regimento de Artilharia Ligeira Nº 3 em Évora no dia 13 de Setembro de 1971, fez o IAO na zona de Valverde/Mitra em Dezembro desse ano o0o Embarcou para Angola no dia 2 de Abril de 1972 (Domingo de Páscoa) num Boeing 707 dos Tams e regressou no dia 23 de Julho de 1974, após 842 dias na ZML de Angola, no subsector de Gago Coutinho, Província do Moxico o0o Rendemos a CCAÇ.3370 em Luanguinga em 11 de Abril de 1972 e fomos rendidos pela CCAÇ.4246 na Colina do Nengo em Junho de 1974. Estivemos adidos em 72/73 ao BCav.3862 e em 73/74 ao BArt.6320 oOo O efectivo da Companhia era formada por 1 Capitão Miliciano, 4 Alferes Mil, 2 1º Sargentos do QP, 15 Furriéis Mil, 44 1º Cabos, 106 Soldados, num total de 172 Homens, entre os quais 125 Continentais, 43 Cabo-Verdianos e 4 Açorianos» oOo

segunda-feira, 23 de agosto de 2010

IN MEMORIAM de Joaquim Pedro Faustino Ricardo

1º.Cabo Artª - CArt 3514
Nasceu: 29JUN50 * Faleceu a 23AGO72
Nascido no Lugar de Chanca, na freguesia de Sobral da Abelheira, no Concelho de Mafra, Joaquim Pedro Faustino Ricardo, foi 1º.Cabo de Artilharia, mobilizado pelo extinto RAL Nº3, de Évora, integrado nos efectivos da CArt 3514 que, em 02ABR72( Domingo de Páscoa) , foi transportada em avião TAM de Lisboa para a então RMA e, seguidamente, encaminhada para o Leste de Angola (sub-sector de Gago Coutinho, actual Lumbala Nguimbo, província de Moxico).
Ainda mal tínhamos aquecido o lugar aonde nos colocaram quando, após pouco mais de um mês decorrido sobre a nossa chegada à zona que nos foi atribuída, começámos logo a ser perseguidos pelo azar, tendo falecido por acidente (afogamento) o primeiro camarada nosso!... Mas este já foi lembrado em devido tempo e, por isso, não falaremos dele neste “post”.
Ainda mal tínhamos ultrapassado o primeiro contratempo quando, passado pouco mais de três meses, somos novamente visitados pelo azar (*). Estava a sede da CArt.3514 em Gago Coutinho, quando, subitamente, chega à Secretaria a infausta notícia de que, naquele dia (23AGO72), tinha falecido, em acidente de viação, que lhe originou a morte quase instantânea, o nosso Camarada 1ºCabo de Artª. Joaquim Pedro Faustino Ricardo, do 2ºGC, que estava no Destacamento do Rio Luce, situado na Estrada Gago Coutinho/Ninda. (Tinha apenas 22 anos, cumpridos há 52 dias!...)
O efeito de uma notícia destas, assim de improviso, é desastroso no ânimo das pessoas que as recebem, mas estas têem que reagir pois vão ter pela frente uma carga de trabalho que devem levar a bom termo, para correr tudo pelo melhor e como deve ser. Tinham que ser comunicadas aos órgãos respectivos da Administração de Pessoal essas ocorrências, que seriam confirmadas por uma segunda comunicação e, posteriormente, accionados os mecanismos necessários para a recolha dos bens pessoais do falecido, tratar da documentação necessária para a liquidação de vencimentos, tratar de subsídios de funeral e trasladação do mesmo para junto da família, etc., etc.!...
Mas esta história já é demais conhecida de toda a gente e, por essa razão, iremos ocupar-nos de outros temas, como por exemplo, o recordar, o reviver, não a tragédia, mas sim a pessoa a que nos queremos referir e começamos por apresentar no início: O 1º.Cabo Joaquim Pedro Faustino Ricardo, do 2º.GC/CArt 3514 e, pela nossa parte temos a dizer que conhecia o seu nome, tal como conhecia o nome de todos os componentes da Companhia, uma vez que, nos diversos registos que nela haviam, como sejam os de vencimentos e alimentação e que eram renovados mensalmente e escriturados diariamente, mas não passava disso e podemos dizer que dele só tínhamos um conhecimento digamos que “burocrático” e “administrativo”!... Tínhamos também o conhecimento de que tinha bom comportamento militar e disciplinar e que era de trato educado e acessível para com os superiores, camaradas e inferiores. “Boa Praça” ,como se costumava dizer no “calão” militar, acerca de todos aqueles que tinham comportamento semelhante.
Face ao acima exposto, pouco mais haverá a dizer e o que se disser será dirigido ao Cabo Ricardo a quem, por este meio quero dizer que, “ onde quer que estejas, a tua memória estará sempre presente, sejam em que condições forem e onde estiverem presentes qualquer um dos teus velhos Camaradas “Panteras Negras”!......Digo-te mais: “Podes ter a certeza de que enquanto viver um destes teus Camaradas, a tua memória viverá tanto quanto o último deles viver!...
Um dia, certamente, nos encontraremos!...Até lá”!...
Para toda a família “Panteras Negras”, cordiais saudações do Camarada, Botelho

domingo, 8 de agosto de 2010

Boca do dia "Rotação para BA9 - Luanda"

"Non comment" Amigo Arlindo desta não te lembravas, muito menos daquela boca do dia sobre a BA9

Carvalhito,
Aqui te envio as fotos que o "Elisio" Soares me deu para te mandar, as que o Oliveira me deu, e uma minha, do dia do meu aniversário (26/6/73), e as cartas que recebi em teu nome, após a tua partida. Novidades de cá: O Soares (furriel) e o Soares (enfermeiro) estiveram hospitalizados, por irem na Berliett do Pires que rebentou uma mina AC entre o Mukoy e o Luathe no dia ?/7/73. Ninguém se feriu muito, o "Cacimbo" levou sete pontos abaixo da vista esquerda e fêz um corte na cabeça..!! O Soares levou quatro pontos numa perna..!! Foi o "Baptismo". O Soares já deve estar no Açores, arrancou a 1- 8. Sem mais, um abraço do Pelotão e dum modo especial, deste teu amigo, Arlindo ,8.8.73
Boca do dia "Rotação para BA9 - Luanda"

domingo, 1 de agosto de 2010

A Caminho das "Terras do Fim do Mundo" (4)

Tenho a certeza que, todos nós, quando escrevemos ou fazemos um comentário sobre qualquer “post” que publicamos no blogue, procuramos relatar os acontecimentos verídicos. Todavia, esses episódios foram passados há quase 40 anos e, por isso, não se pretende com o que fica escrito, fazer uma tradução exacta dos acontecimentos reais, mas sim uma descrição com excertos dos factos mais relevantes e porque não, mais humorísticos também, que retivemos na memória, desse período marcante das nossas vidas.
Depois desta ressalva, vou tentar prosseguir com a promessa de continuar a descrição da "odisseia" que, foi a nossa ida e volta às Terras do Fim do Mundo .
Chegados ao Lufuta, depois das "tretas" burocráticas de substituição do pelotão da CCaç3370, ali sediado, ficamos entregues à nossa sina!... A nossa principal missão era a de dar protecção às máquinas da TECNIL, empresa empenhada nas várias frentes de trabalhos da construção da via de ligação Luso/Gago Coutinho/Ninda, e que, naquele local, fazia a extracção de “laterites”(*), que eram utilizadas para a consolidação e compactação das areias e servir de base ao alcatrão na via que então se construía.
O local, no aspecto paisagístico, até não era feio!... Ficava numa pequena elevação de terreno, num outeiro sobranceiro à "chana"(**) e ao rio que dava o nome ao local - Rio Lufuta. Mas era medonha a situação em que ficámos!... Meia dúzia de barracas, que se pretendiam ocultar nas últimas árvores da mata ou nas primeiras, conforme o ângulo de apreciação escolhido, sem protecção de espécie alguma.
Destacamento do Lufuta
Bem!...Existiam uns pseudo-abrigos cavados no chão, à volta do acampamento, onde caberiam duas pessoas com muito boa vontade, e que me pareceram, em primeira análise, quase que como umas covas, não com sete palmos de fundo(!!!), mas aí com três, no máximo!... Mal nos sentimos sós, começou a remoer em mim o tão propalado instinto de conservação. Algo que nos faz inventar as melhores maneiras de salvarmos a pele, quando algo nos ameaça a integridade física e psicológica.
Eu nunca tinha testado o meu e não estava nada, mesmo nada, interessado em que isso acontecesse, daí achar que os ditos abrigos, não serviam para nada!... Mas, passado algum tempo, verifiquei estar completamente enganado!...
Era frequente ouvir, nas conversas de quem já tinha ido à guerra, que os nossos "amigos do IN", sempre que os maçaricos chegavam, gostavam de lhes apalpar o pulso e conforme a sua reacção, se esta fosse brava e destemida ou mole e medrosa, assim os respeitariam ou chateariam durante todo o tempo. Eu, esperava a todo o momento por essa situação, que felizmente, para sorte da CArt 3514, nunca aconteceu!... Mas como “cautela e caldos de galinha” nunca fizeram mal a ninguém, a situação em que se vivia era, essencialmente, de alerta constante e que subia de nível durante a noite.
Tinham sido dadas ordens severas às sentinelas, pelo Comandante do 4º.Grupo, de que, em caso de verificarem qualquer anormalidade, não fosse feito fogo com a G3, porque isso só denunciaria a sua posição e, por isso, ficariam na situação fácil de um alvo a abater. Em caso de necessidade, deveriam lançar uma granada das ofensivas que serviria para alertar todo o nosso efectivo e permitiria que o pessoal saltasse para os ditos abrigos. Isto era repetido até à exaustão e era, mais ou menos, cumprido por toda a gente.
Uma bela noite, aí pelas 23:00 horas,( em África, anoitecia cerca das 17:00 horas e o crepúsculo do alvorecer era por volta das 04:30 horas) no Lufuta, a essa hora, os que não estavam de sentinela, já faziam meia-noite como é usual dizer-se. Pois meus amigos, e os do 4º Grupo de certeza que não esqueceram, inopinadamente, ouve-se o rebentamento de uma granada!!! Eu que ainda, nessa mesma noite, antes de adormecer tinha dito ao Alferes Maurício Ribeiro, nosso Comandante de Grupo, que a partir deste momento não mais tratarei pelo posto hierárquico dessa época, mas sim por Maurício, porque foi assim que sempre o tratei, dada a nossa grande amizade e o facto da tropa ter acabado no momento do desembarque, mas dizia-lhe eu: - Um dia destes os "gajos" vem aí fazer um festival!...
Adormeci com isto no pensamento, pelo que quando ouvi o estrondo do rebentamento, saltei como uma mola e, de arma em punho, fui parar ao abrigo que me era destinado e que ficava por trás da barraca. Não sei se cheguei primeiro se depois do Maurício, mas que cheguei depressa isso cheguei tal era o "cagaço" miudinho que me percorria a "espinha" e com a real convicção de que quem tem "o dito cujo" tem medo!... Bem!...Esperámos uns breves minutos e como nada mais se registasse (além do silêncio da mata, cheio de pequenos barulhos próprios da fauna das savanas africanas e que com o hábito, já não é barulho mas melodia), verificámos que não havia nada e que tudo fora um falso alarme!... Qualquer animal que se tinha aproximado e feito barulho, provocando aquela reacção à sentinela, que devia estar com tanta "coragem" como qualquer um de nós. Eu pelo menos estou a confessar a minha, daquele momento. Sempre soube lidar com os meus medos, mas não tinha nem nunca tive pretensões de ser herói. Agora estava lá para defender caro a minha pele e a do nosso pessoal. O facto de não querer ser herói nunca fez de mim cobarde.
Antes de mandar desmobilizar o pessoal, fomos ver como tinha sido a sua reacção e como este se tinham comportado e abrigado!!!...
Aí, então verifiquei, que os tais abrigos de que falei atrás tinham a sua função e eram efectivamente "bem dimensionados", isto porque nas tais "covas" couberam, em algumas delas, quatro elementos e podem crer que não haveria bala, se o acto tivesse sido real, que lhes tocasse!... Bem, isto apesar de ser uma narração, se for feita, toda de uma vez é maçadora e enfadonha, e por isso e por agora, fico-me por aqui, na certeza de que voltarei para contar mais um ou dois "episódios" que se passaram no Lufuta, local que, apesar de tudo, teve o seu encanto!!!
Na esplanada do Lufuta; Raul Sousa, Nauricio e Monteiro
Um abraço a todos os elementos, que como eu, fazem parte da família "Panteras Negras". Vemo-nos em Fátima .
(*)”laterites” – rocha das regiões tropicais, formada essencialmente por hidróxidos de ferro e alumínio, em regra com concreções pisolíticas (em forma de ervilhas).
(**)”chana” – Grande planície alagadiça, do tipo “lezíria”, alagada ou seca, conforme a estação do ano(molhada ,com a subida de nível dos rios, na época chuvosa e seca na estação “seca”).