D`este viver aqui neste papel descripto
É este o título dum livro do Escritor António Lobo Antunes, Alferes Médico que esteve destacado em Ninda no Leste de Angola, de Dezembro 1970 a Janeiro 1972 incorporado na Cart.3313 sob o comando do Capitão Melo Antunes e integrado operacionalmente no Bart.3835 com CCS. do Batalhão sediada em Gago Coutinho. Escreveu cartas á sua amada com o que lhe ia na alma, tal como todos nós o fizemos. As filhas Joana e Maria João organizaram a correspondência, do pai para a mãe, nessa época e transcreveram-na em livro, editado pela Dom Quixote. No dia 27 de Janeiro de 71, Lobo Antunes escrevia assim:
“Minha namorada querida
Aqui cheguei, finalmente, a Gago Coutinho, depois de uma viagem apocalíptica, como nunca pensei ter de fazer em qualquer época da minha vida: partimos às 3 horas da manhã dia 22, em autocarros tipo Claras, de Luanda para Nova Lisboa, através de um cenário maravilhoso, mas que à 23ª hora começou a cansar-me. Chegámos de madrugada a Nova Lisboa, dormimos nas camionetas, e às 3 da tarde do dia 29 (ou 23?), depois dos 600 km de autocarro, meteram-nos no comboio para o Luso: 2 dias de viagem em vagões de 4ª classe – essa famosa invenção dos ingleses para os habitantes do 3º mundo, e que a companhia dos caminhos-de-ferro de Benguela inglêsmente adoptou - em grandes molhos de pernas e de braços, de armas e de cabeças. Essas carruagens possuem apenas 3 únicos bancos longitudinais: dois ao correr das janelas e o último, duplo, ao centro, como uma risca ao meio. Como faltavam vagões , assistiu-se então a um espectáculo indescritível: de todo o lado surgiram membros que pareciam não pertencer a nenhum corpo. Cheguei a coçar a minha cabeça com uma mão alheia. Aí dormia, ou fingia dormir, e comia as conservas que inundavam o chão de latas e de molhos, e que me estragaram completamente as vísceras. Deportados judeus para um campo de concentração nazi. E depois veio o inferno, ou inferno maior, o sétimo inferno inversamente comparável ao 7º céu de Maomé: agarraram em nós e meteram-nos em camionetas de carga para os 500 km minados que separam o Luso de Gago Coutinho: dois bate-minas à frente (duas berlietts carregadas de sacos de areia) e depois uma extensa fila de carros, onde seguíamos de arma apontada numa tensão de ataque iminente. Felizmente não houve minas nem emboscadas, mas aconteceu uma coisa horrível: a camioneta em que eu seguia, a última (por sorteio) partiu a direcção, a uma velocidade considerável, e esmagou-se numa vala. Eram 21: três braços partidos, e pernas, várias outras lesões sortidas, e eu com seis pontos no lábio e 3 na língua: ainda não a sinto. Caímos todos uns por cima dos outros, e pensei que tivesse sofrido mais do que isso porque o corpo dava-me a sensação de se encontrar multiplamente rachado. Mas tudo passou, continuo a resistir, e amo-te. Isto é o fim do mundo: pântanos e areia. A pior zona de guerra de Angola: 126 baixas no batalhão que rendemos, embora apenas com dois mortos, mas com amputações várias. Minas por todo o lado."
in D`este viver aqui neste papel descripto.
Comentários para quê..!!
Nota: O Bart.3835 (Força e Áudacia) rodou em Janeiro de 1972 para Malange, sendo rendido em Gago Coutinho pelo Bcav.3862 (Cavalo Branco) ao qual a Cart.3514 ficou adida operacionalmente em Abril de 1972.
quarta-feira, 13 de agosto de 2008
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camarada este comentario fesme lembrare a minha xegada a gago coutinho pois foi igual a vossa estive a lere estava a rever a minha xagadaao p.a.d 2285 os diferentespois eu lembrome perfeitamente da vossa xegada um abraco e oubrigada por tudo que tem feito alfredo ribeiro
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