Lufuta, novamente o Lufuta!... E porquê? Porque foi aqui que nos adaptámos rapidamente a África, à beleza do seu entardecer, onde começámos o nosso abraço mais profundo com a terra africana, negra,... roxa... e branca, onde até as laterites extraídas da terra tinham uma cor avermelhada de sangue!... Foi por aqui que, como os restantes camaradas, do Lutembo, do Lubango e de Luanguinga, nos confrontámos com um céu, que de dia ou de noite não compreendíamos, mas admirávamos em segredo. Enfim, um horizonte ilimitado que faz guardar recordações desta região no íntimo de quem por lá passou um dia. Estávamos a iniciar a chamada época do cacimbo, meteorológico e psicológico, e íamos aprender que ele corresponde no calendário ao verão do "puto", por ser o tempo em que ia haver menos calor. Só que em Angola ninguém pensava no frio que fazia durante a noite.
Apesar desta idiossincrasia, não esquecíamos nunca o factor que nos fazia ali permanecer, éramos um grupo de combate, e a nossa missão era estar de olhos bem abertos para não sermos colhidos de surpresa e, sem consequências de qualquer espécie, já tínhamos apanhado os nossos "cagaços"!... Daí, era de “bom tom” estarmos bem com todos e com o "Patrão lá do Alto", para onde, menos materialistas do que hoje, ao primeiro sinal de alarme, recorríamos, embora de arma na mão, à sua protecção Divina. Parecer-vos-á uma dicotomia incompreensível, mas era verdadeira e acontecia nos bons e maus momentos. Seguindo este espírito, já a manhã daquele dia sete de Maio de mil novecentos e setenta e dois ia muito alta, quando recebemos a visita do capelão militar que iria celebrar uma missa ali, no Lufuta. Ali se concentrou o pessoal que escoltava o Capelão, vindo de Luanguinga, a quem se tinha juntado à passagem o pessoal do Lubango e de onde confluíram também os destacados no Lutembo. Tratava-se de uma missa celebrada por um militar e para militares. Combinou-se que, na hora do ritual da consagração, na falta de clarins que abrilhantassem a cerimónia, eu e o meu camarada Raul Sousa, subíssemos as barreiras de protecção e lançássemos cada um a sua granada ofensiva M/62(1). Todo o pessoal tomou conhecimento, ou melhor, pensou-se que todos teriam tomado. No entanto, como todo o pessoal não chegou exactamente no mesmo momento, houve ali qualquer falha de comunicação inesperada. Muitos de vós certamente estarão lembrados, pelo menos, do caricato do sucedido!... Chegado ao momento combinado, à indicação dada pelo celebrante e corroborada pelo Maurício Ribeiro, com a maior das calmas, tiramos as cavilhas às granadas e do cimo da barreira, atirámo-las para um fosso ali existente. Foram dois estrondos sucessivos de granada...Quando nos voltámos para regressar ao local onde era suposto continuar a cerimónia, só vimos o pessoal em grande correria á procura de armas uns atrás dos outros. O celebrante, olhou para nós, mas perante a debandada geral, abandonou o altar improvisado e “ala que se faz tarde”. Nós os "guerrilheiros" causadores desta aflição, ficamos imóveis, atónitos e com um misto de vontade de rir, mas ao mesmo tempo de medo, do que poderia ter acontecido no meio daquela "guerra". A missa, depois de serenados os ânimos, continuou... mas o espírito religioso e o grupo coral, vindo de Luanguinga se não me falha a memória dirigido pelo nosso amigo e camarada António Soares, acabou com os estrondos. Mas meus caros amigos, eu só não participei na debandada geral à procura de um abrigo, porque tinha sido um dos autores da "tramóia", caso contrário, quem tem o dito cujo no fundo das costa tem medo...Nesse dia, ao final da tarde, tivemos o primeiro desgosto da nossa comissão!... Chegava a infausta notícia de que o nosso Camarada Ernesto Gomes, de saudosa memória, havia perecido por afogamento, no rio Lutembo!... Daí também, a data de 07/05/1972, permanecer indelével no “baú das recordações”!... Como isto está já demasiado longo e, talvez, correndo o risco de me tornar fastidioso, resta-me encerrar o capítulo LUFUTA, por onde só voltei a passar no regresso, no final da comissão.
Em especial, a todos os camaradas que fizeram parte do 4º grupo e, em geral, a toda a família “Panteras Negras”, um grande abraço.
(1) - É uma arma de arremesso destinada ao combate próximo. Actua por efeito moral (grande estrondo) e por acção de sopro
Apesar desta idiossincrasia, não esquecíamos nunca o factor que nos fazia ali permanecer, éramos um grupo de combate, e a nossa missão era estar de olhos bem abertos para não sermos colhidos de surpresa e, sem consequências de qualquer espécie, já tínhamos apanhado os nossos "cagaços"!... Daí, era de “bom tom” estarmos bem com todos e com o "Patrão lá do Alto", para onde, menos materialistas do que hoje, ao primeiro sinal de alarme, recorríamos, embora de arma na mão, à sua protecção Divina. Parecer-vos-á uma dicotomia incompreensível, mas era verdadeira e acontecia nos bons e maus momentos. Seguindo este espírito, já a manhã daquele dia sete de Maio de mil novecentos e setenta e dois ia muito alta, quando recebemos a visita do capelão militar que iria celebrar uma missa ali, no Lufuta. Ali se concentrou o pessoal que escoltava o Capelão, vindo de Luanguinga, a quem se tinha juntado à passagem o pessoal do Lubango e de onde confluíram também os destacados no Lutembo. Tratava-se de uma missa celebrada por um militar e para militares. Combinou-se que, na hora do ritual da consagração, na falta de clarins que abrilhantassem a cerimónia, eu e o meu camarada Raul Sousa, subíssemos as barreiras de protecção e lançássemos cada um a sua granada ofensiva M/62(1). Todo o pessoal tomou conhecimento, ou melhor, pensou-se que todos teriam tomado. No entanto, como todo o pessoal não chegou exactamente no mesmo momento, houve ali qualquer falha de comunicação inesperada. Muitos de vós certamente estarão lembrados, pelo menos, do caricato do sucedido!... Chegado ao momento combinado, à indicação dada pelo celebrante e corroborada pelo Maurício Ribeiro, com a maior das calmas, tiramos as cavilhas às granadas e do cimo da barreira, atirámo-las para um fosso ali existente. Foram dois estrondos sucessivos de granada...Quando nos voltámos para regressar ao local onde era suposto continuar a cerimónia, só vimos o pessoal em grande correria á procura de armas uns atrás dos outros. O celebrante, olhou para nós, mas perante a debandada geral, abandonou o altar improvisado e “ala que se faz tarde”. Nós os "guerrilheiros" causadores desta aflição, ficamos imóveis, atónitos e com um misto de vontade de rir, mas ao mesmo tempo de medo, do que poderia ter acontecido no meio daquela "guerra". A missa, depois de serenados os ânimos, continuou... mas o espírito religioso e o grupo coral, vindo de Luanguinga se não me falha a memória dirigido pelo nosso amigo e camarada António Soares, acabou com os estrondos. Mas meus caros amigos, eu só não participei na debandada geral à procura de um abrigo, porque tinha sido um dos autores da "tramóia", caso contrário, quem tem o dito cujo no fundo das costa tem medo...Nesse dia, ao final da tarde, tivemos o primeiro desgosto da nossa comissão!... Chegava a infausta notícia de que o nosso Camarada Ernesto Gomes, de saudosa memória, havia perecido por afogamento, no rio Lutembo!... Daí também, a data de 07/05/1972, permanecer indelével no “baú das recordações”!... Como isto está já demasiado longo e, talvez, correndo o risco de me tornar fastidioso, resta-me encerrar o capítulo LUFUTA, por onde só voltei a passar no regresso, no final da comissão.
Em especial, a todos os camaradas que fizeram parte do 4º grupo e, em geral, a toda a família “Panteras Negras”, um grande abraço.
(1) - É uma arma de arremesso destinada ao combate próximo. Actua por efeito moral (grande estrondo) e por acção de sopro
Esqueceste-te de dizer que o único que não fugiu foi o Maurício.Ali ficou, imóvel, de costas para o local onde as granadas foram atiradas, com aquela categoria que o caracterizava...
ResponderEliminarQuanto ao padre apenas dizia:
OK eu sabia o que vocês iam fazer mas como vi toda a gente a fugir ia lá ficar eu, não?