o0o A Companhia de Artilharia 3514 foi formada/mobilizada no Regimento de Artilharia Ligeira Nº 3 em Évora no dia 13 de Setembro de 1971, fez o IAO na zona de Valverde/Mitra em Dezembro desse ano o0o Embarcou para Angola no dia 2 de Abril de 1972 (Domingo de Páscoa) num Boeing 707 dos Tams e regressou no dia 23 de Julho de 1974, após 842 dias na ZML de Angola, no subsector de Gago Coutinho, Província do Moxico o0o Rendemos a CCAÇ.3370 em Luanguinga em 11 de Abril de 1972 e fomos rendidos pela CCAÇ.4246 na Colina do Nengo em Junho de 1974. Estivemos adidos em 72/73 ao BCav.3862 e em 73/74 ao BArt.6320 oOo O efectivo da Companhia era formada por 1 Capitão Miliciano, 4 Alferes Mil, 2 1º Sargentos do QP, 15 Furriéis Mil, 44 1º Cabos, 106 Soldados, num total de 172 Homens, entre os quais 125 Continentais, 43 Cabo-Verdianos e 4 Açorianos» oOo

quinta-feira, 26 de fevereiro de 2009

A face oculta da guerra no Leste de Angola (4)

continuação de (3)
O major Sachilombo
O major Sachilombo, preto retinto, começou a ficar cinzento, e eu fiquei com "pele de galinha". Só o major sul-africano e o piloto não se aperceberam da situação. O Teixeira Martins ainda alvitrou, percorrermos a distância a pé, até ao ponto de encontro, na mata densa. O Sachilombo teve uma expressão de suspeita de que alguma coisa estava a correr mal. Decido que iríamos ao local, mas primeiro, faríamos um reconhecimento por cima com o helicóptero e se tudo estivesse normal, procuraríamos um local para aterrar. Levantámos voo, a prumo. O piloto fez notar que o combustível estava no fim e que o mais seguro seria ir rapidamente a Cangamba, encher o depósito e voltar. Assim o fez. Regressámos ao ponto de reunião. Estava um fim de tarde africano, lindo e quente, quando nos aproximámos do monte onde nos esperavam. Foi então que se deu um facto curioso. Começou a cair do céu uma chuva densa e forte sobre a colina. O piloto declarou que ali não se via um palmo diante do nariz e não podia aterrar. Demos mais umas voltas no ar à espera que a chuva abrandasse. Como estávamos já quase no crepúsculo, o piloto sugeriu voltarmos a Cangamba e regressar, muito cedo, no dia seguinte. Como, num navio ou aeronave, acima do comandante (piloto) só está Deus, acatámos a decisão do piloto, um tenente da força aérea da África do Sul. Nós tínhamos planeado a operação e baptizámo-la de Viragem. De novo em Cangamba, por volta das 23 horas, recebi uma comunicação rádio de um radiotelegrafista da PIDE, o Oliveira, dizendo que os nossos Flechas da missão de paz tinham sido trucidados, bem como alguns elementos da UNITA que estavam de boa fé. Acrescentou que, no acampamento da UNITA onde ele estava, a população e os guerrilheiros estavam desorientados e muitos deles a fugir para a mata. Disse ainda que no local de reunião, onde nós éramos esperados, estavam cerca de sessenta guerrilheiros e que tinham preparado uma emboscada para mim e para o Teixeira Martins. Ordenei-lhe que destruísse o rádio e os códigos e que se internasse na mata que nós, ao alvorecer, lá estaríamos com helicópteros para o apanhar bem como a alguns Flechas que tivessem escapado. Ao raiar do dia saíram de Cangamba quatro helicópteros, todos os que tínhamos. Passámos o local a pente fino. Recuperámos cinco Flechas vivos e o Oliveira. Encontrámos os restos mortais de nove Flechas, crivados de balas e cortados à catanada de maneira tão sádica que me é impossível descrever. Muitos anos depois, era eu major dos serviços de intelligence militar da África do Sul, voava de Lanseria para Katima Mulilo, na Namíbia, com o coronel Kemp e com Nzau Puna, secretário-geral da UNITA. O Puna quis brilhar e contou ao coronel aquilo que ele achava uma traição dos portugueses. Era então, a nossa operação Viragem, em sentido contrário. Os portugueses eram os maus e os da UNITA, que até tinham baptizado a operação de "Baile", eram as vítimas. E o mais chato disto tudo, é que fui que tive de traduzir. Sempre houve desinteligências tribais na UNITA. Alguns elementos, muito poucos, não concordavam com a mudança da UNITA. A Operação Baile destinava-se a capturar o Teixeira Martins e a mim. Talvez, na melhor das hipóteses, para estabelecer negociações em situação de vantagem.
"No dia 5 de Outubro de 1970, houve uma operação no Cuito Cuanavale, uma operação conjunta de militares, de polícia, de Flechas, de toda a gente. Nessa operação houve um flecha meu que morreu. Eu costumava ir com eles mas nessa altura estava no PC (Posto de Comando) e recebi uma mensagem de evacuação urgente, num determinado sítio, a meio do rio Cuanavale.Fui num helicóptero. Era um flecha meu que estava gravemente ferido, tinha havido um contacto. Quando eu cheguei ao local eles faziam uma fogueira para referenciar onde estavam, para o helicóptero aterrar. O flecha estava todo ferido, cheio de buracos, e estava agarrado a uma Kalashnikov. Quando me viu, entregou-me a arma que ele tinha capturado ao inimigo e morreu nos meus braços. Na minha sala de operações estava assinalado, no sítio onde ele morreu, o nome dele, Lumai Dala, com uma bandeirinha. Eu estava nessa altura a fazer um briefing a oficiais sul-africanos, oficiais portugueses e polícia. Houve um sul-africano que perguntou o que é que significava Lumai Dala. Expliquei-lhe a situação. O homem tomou conta daquilo e depois ofereceu-me uma chapinha de prata que diz assim: "Lumai Dala, morto em combate. 5 Outubro de 1970." Pus a chapinha na espingarda e andava com a espingarda. Na rua António Maria Cardoso, quem subia a escadaria principal, havia várias lápides de mármore. Uma delas dizia: "Lumai Dala. Morto em combate." Ao cimo, estava uma frase de Salazar: "Havemos de chorar os mortos se os vivos o não merecerem." O Lumai Dala morreu, mas a operação foi positiva. Entretanto, o meu director tinha-me prometido a directoria do campo de prisioneiros de São Nicolau, que não era uma prisão da PIDE, era uma prisão administrativa que, a partir de determinada altura, funcionava mais como um centro de recuperação, até porque não havia grades, não havia nada, até tinha banda de música. Nós mandávamo-los embora e eles diziam: "O que é que vai ser de mim agora, patrão?" Estive a chefiar Carmona e o meu director, São José Lopes, que eu respeito muito, disse-me que já não ia para lá. Vim para cá e fui trabalhar para a Secção Central com o Pereira de Carvalho".
A partir de 1968 existiu mesmo no Cuito Cuanavale uma organização, chamada Centro Conjunto de Apoio Aéreo (CCAA), constituída por oficiais do Exército português e da Força Aérea, oficiais sul-africanos e elementos da PIDE. As Forças Armadas sul-africanas forneciam-nos helicópteros e meios aéreos, forneciam-nos o que era preciso. Os sul-africanos estavam interessados na UNITA, na medida em que a UNITA e a SWAPO trabalhavam em conjunto e nós fazíamos uma espécie de tampão à SWAPO, que tinha de atravessar o Cuando-Cubango, e várias vezes tivemos contactos com os guerrilheiros namibianos. Uma das vezes que fui ferido, foi pela SWAPO: apanhei um estilhaço na mão. Foi uma operação que fizemos em colaboração com os sul-africanos. No Cuando-Cubango, tínhamos postos da PIDE em Serpa Pinto, em Caiundo, Cuangar, Calai, Dirico, Mucusso, Rivungo, Cuito Cuanavale e Mavinga. Tínhamos a colaboração dos caçadores das três coutadas: Kirongozi, Luenge e Mucusso, em que os nossos funcionários e os caçadores guias viviam juntos. Tudo isto em conjunto com a tropa. Tínhamos um batalhão em Serpa Pinto, na Neriquinha uma companhia comandada pelo Vítor Alves, um pelotão reforçado na Luiana e meia-dúzia de gatos-pingados em Mavinga. Os comerciantes, e os elementos da PSP etc. também faziam operações conjuntas com os Flechas. E sempre que havia operações militares, lá iam os Flechas, ou ia um agente da PIDE com um flecha, que às vezes servia de intérprete, e esse flecha colaborava".
(p. 410-411-412) Fim
Entrevista a Óscar Cardoso ex-agente da DGS
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